Psicanálise no parque: projeto social oferece escuta gratuita em área verde do Sudoeste

Todas as quartas-feiras, entre 9h e 12h, um banco à sombra de árvores no Parque Urbano Bosque do Sudoeste se transforma em consultório a céu aberto. É ali que o psicanalista Isinaldo Oliveira do Nascimento, 44 anos, morador do Cruzeiro Novo, realiza atendimentos gratuitos com base na escuta psicanalítica. O projeto, iniciado em 7 de maio com apoio da administração do parque, tem como missão ampliar o acesso à saúde mental e desmistificar a prática da psicanálise, muitas vezes cercada por preconceitos e elitismo.
A cada semana, entre cinco e sete pessoas passam pelas sessões de 30 minutos, com direito a até três encontros por paciente. Os agendamentos são feitos com o auxílio da professora Teresa, responsável por atividades para idosos na região e parceira da iniciativa. “Sempre tive vontade de desenvolver uma ação social. Eu mesmo procurei a administração e recebi apoio. A Teresa ficou encarregada da organização dos atendimentos”, conta Isinaldo.
A proposta não é apenas oferecer ajuda imediata, mas também apresentar a psicanálise como ferramenta de autoconhecimento e reconstrução subjetiva. “Ainda existem muitas pessoas com tabu em cima de um acompanhamento de psicanálise ou psicólogo. Mas todos precisamos cuidar da saúde mental”, afirma o terapeuta, que é mestrando em psicanálise comportamental. Formado em Psicologia no fim da pandemia, ele decidiu seguir exclusivamente pela via da psicanálise. “Na psicologia trabalhamos muito o consciente. A psicanálise vai além: acessa o inconsciente, aquilo que o paciente não consegue dizer.”
Criada pelo médico austríaco Sigmund Freud, a psicanálise é um método terapêutico que investiga conflitos internos por meio da fala, revelando emoções primitivas, traumas ocultos e padrões inconscientes. Ao escutar sem julgamento e acolher o sofrimento psíquico, o psicanalista ajuda o paciente a ressignificar vivências e reorganizar sua trajetória emocional. Isinaldo tem se aprofundado em temas como ansiedade, depressão, transtorno do pânico e risco de suicídio — temas que surgem com frequência entre os atendidos.
“Já ouvi muitos relatos de uso impulsivo de medicamentos indicados por amigos ou familiares, sem qualquer prescrição médica. Quando percebo isso, oriento imediatamente a procurar um psiquiatra. Às vezes a pessoa acha que tem ansiedade, mas é pânico. Ou pensa que está com depressão, quando é TAG (transtorno de ansiedade generalizada). Nosso trabalho também ajuda nesse diagnóstico inicial”, explica.

Entre os beneficiados pelo projeto está a aposentada Odete Cardoso de Araújo, de 65 anos, moradora da Octogonal. Ela conheceu a iniciativa por meio da professora Teresa, e há menos de um mês iniciou os atendimentos com Isinaldo. “Hoje foi meu terceiro encontro com ele. Já fiz outras terapias antes, mas essa é a primeira vez com um terapeuta homem. Achei interessante minha própria abertura. A gente acha que só consegue dizer certas coisas para mulheres, mas com ele me senti à vontade”, relata.
Odete carrega uma série de vivências marcantes — como o luto dos pais, um sequestro relâmpago e um acidente de carro —, que vêm sendo trabalhadas nas conversas sob o céu aberto. “Sempre fui deixando meu ‘lixinho’ lá. Nunca saí de uma terapia tremendo, com medo de dirigir ou de sair à noite. E aqui é ainda mais acolhedor. Não parece que estamos numa sala fechada, é como uma conversa leve, quase uma brincadeira”, diz, sorrindo.
Além dos ganhos emocionais, ela valoriza o cenário natural como parte da experiência terapêutica. “Aqui eu relaxo de verdade. Nem sinto fome, nem vontade de ir embora. E ainda tem a presença dos animais. É incrível”, afirma. Odete pretende dar continuidade ao tratamento, mesmo após o período gratuito, caso as condições financeiras e a agenda permitam. “É uma questão de consciência também. Quem já experimentou essa parte gratuita e se beneficiou, se puder, deve levar adiante.”

A iniciativa de Isinaldo, além de um gesto de solidariedade, é também um convite à transformação coletiva. “A ideia é que mais psicólogos, psicanalistas e profissionais da saúde mental enxerguem a importância de levar esse tipo de cuidado para as praças, para os espaços públicos. O Brasil é o país com maior número de casos de ansiedade e depressão. A quantidade de suicídios aqui no DF é alarmante. Esse é um trabalho de urgência — é vida que a gente está tentando salvar”, conclui o psicanalista.
Para agendar uma sessão, basta ter mais de 14 anos e entrar em contato pelo telefone (61) 99977-2255 (falar com Teresa), além de outras informações no instagram do psicanalista @isinaldo_psic.